I
A um mês e um dia de fazeres anos, deixas-nos. Sozinhas. Mais. Com quem vou eu agora 'partir' os meus assuntos? Com quem vou rir de tudo e de nada? Com quem vou desabafar sobre 'recursos humanos', imateriais ou emocionais? Com quem vou ser eu para ti? Com quem?
Eras única. Para mim. Estou mais pobre. Muito mais. Penso que a riqueza de uma pessoa se vê pelos amigos que junta a sua volta. Muitos e muitas no teu caso.
Tudo me dá vontade de chorar, olhar para o céu, pensar em nós, dos tempos de sociologia, às noitadas no bairro alto, a campanha anual das peras. Eduarda, companheira de sempre, se vires o meu pai, dá-lhe um abraço,
Cristina
II
Passei Coimbra b. Vou ao teu encontro. Hoje, sem saber de nada, vesti-me com as calças axadrezadas que um dia me ofereceste. Estavam demasiado largas, disseste. Nunca fomos amigas de trocar roupa, números diferentes, mas de (nos) oferecer peças especiais. O teu amor pela roupa e gosto eram parecidos com os meus, embora tu te desfizesses mais facilmente da roupa. Sou muito ligada a tudo. Mas no campeonato do estar ligada, ganhas aos pontos no que toca Beatles. Temos de escolher uma música deles para o dia do teu funeral. Será assim que me despedirei de ti. Nunca soube que canção gostavas mais, estou agora a ouvir em tua memória Eduarda, strawberry fields forever ~
III
Eduarda, consigo olhar para o céu e não chorar. A paisagem está aliás a levar-me para o teu Alentejo, embora tenha acabado de passar o entroncamento. Efeitos do lugar...talvez, pensei em Alentejo porquê? É um bocado como aquele poema do Al Berto, digo mar e o mar entra-me pela janela. Pode obter-se o mesmo efeito com planícies. Olha, a senhora da voz off no comboio diz, 'next stop : Santarém'. Estamos também a aproximar-mo-nos da hora do lusco fusco. O que nós rimos um dia a propósito do empresário do lusco-fusco, encenado pelo gato-fedorento. Como é que vou viver sem ti e sem nos rirmos, uma com a outra, uma para a outra. Como, alguém me explica, como? (Em viagem, 16 Abril 2019)
Legenda: numa oficina de automóveis em Lisboa, num cenário realista, homenageava-se o dia do/a trabalhador/a, com o argumento da moda, numa produção para o semanário blitz. estávamos no final dos anos 80. com eduarda ferreira (na foto) e joão tabarra (o fotógrafo).
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